quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Barragem subterrânea potencializa lençol freático e oferece sustentabilidade para a produção familiar


Estrutura de captação de água de chuva melhora a vida e a terra de agricultor no sertão paraibano
Eudes Costa - Comunicador popular da ASA
São Francisco - PB
29/08/2013
Agricultor mostra plantação de batatas | Foto: Eudes Costa
Imaginar um cenário de tristeza, de terra rachada, falta de alimento, crianças e mulheres percorrendo longas veredas com a lata d’água na cabeça, ou um/a agricultor/a tangendo um jumentinho com duas ancoretas. Uma situação desesperadora por água. Essas são cenas formadas há anos no imaginário popular do Semiárido e reproduzidas pela grande mídia ou pela indústria da seca. Mas existe outra realidade, com imagens positivas.

Poucas décadas atrás, praticamente durante 13 anos de trajetória, uma ação transformadora aconteceu na vida de milhares de famílias agricultoras do nordeste. Através de processos participativos e sociais voltados para a valorização das pessoas, da cultura e dos recursos naturais, o reconhecimento da capacidade inalterada do sertanejo, que demonstra força e resistência em viver de forma mais digna na sua terra, ganharam visibilidade. Essa transformação surgiu com as construções de tecnologias de captação de águas de chuvas, implantadas pelo Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido, da Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA). 
Pela manhã, José Fábio faz a primeira limpa  no roçado de feijão | Foto: Eudes Costa


Dessa forma, algumas famílias começaram a mostrar a riqueza e a beleza na sua maneira de trabalhar com essas implementações, descobrindo novas alternativas, que se contrapõem a ideia de que a região semiárida é inviável.

Um grande exemplo de viabilidade do Semiárido está na comunidade Prata, no município de São Francisco, no alto sertão da Paraiba, onde mora o casal de agricultores José Fábio Pereira, de 33 anos, e Marileide da Costa, de 30, além da filha do casal, Maria Isabela, de quatro anos.

Com a barragem subterrânea que conquistou junto ao Programa Uma Terra e Duas (P1+2) da ASA, construída em área de baixio, o agricultor tem mantido sua produção agrícola ativa e  aproveitado ao máximo os benefícios que a barragem oferece para sua propriedade; uma delas, a segurança hídrica.
A alegria de José Fábio é constante com a estrutura que tem na sua propriedade. No entanto, a felicidade aumentou ainda mais depois que descobriu que a implementação melhorou o lençol freático da terra. O agricultor percebeu que a água de um velho poço amazonas (cacimbão) aumentou significantemente, e, então, passou a utilizar essa vantagem para intensificar suas plantações, num tempo em que as águas aparecem escassas.

José Fábio alega que antigamente o cacimbão só mantinha sua vitalidade quando eram liberadas as comportas do açude. A situação se agravou depois que houve o abastecimento da comunidade e, com o desperdício, as águas secaram. “A barragem veio em boa hora, foi uma obra bem aplicada, se não fosse ela, hoje eu não teria essa água pra irrigar.” afirma Fábio.

Ao longo deste ano, mesmo com a média pluviométrica de apenas 300 milímetros, Fábio manteve um roçado de salvação através da irrigação por microaspersão, em que mantém a produção de batata, milho, feijão, palma e alguns canteiros de hortaliças. Em um de seus roçados de feijão, o agricultor colheu aproximadamente 12 sacos do legume. Nesse período de estiagem são poucos os cacimbões na região que mantém a mesma capacidade, o dele se manteve num nível que lhe permite irrigar e ainda segurar o abastecimento de sua casa.

A atenção do agricultor está também em cuidar da água que resta, reparando certo gasto que poderia ser evitado, teve a ideia de mudar de horário para irrigar os plantios, trocou o dia pela noite, aproveitando as baixas temperaturas e ganhando mais produtividade, sem que haja forte evaporação, nessa situação, comprovou que o feijão carrega mais, não mucha e nem dá insetos.

Outro jeito encontrado para conservar a água abaixo do subsolo, o agricultor deixa o capim e o mato crescer por toda extensão da barragem. “Se não fosse essa barragem hoje eu estaria pegando água no carro pipa, e só daria para o consumo humano, e plantar ficaria só na vontade, sem poder” destaca.

Criação de ovelhas sendo levadas para manga | Foto: Eudes Costa
O trabalho no sítio começa cedinho, antes que a barra do dia venha clarear. O primeiro canto do galo, que se espalha no silêncio da manhã e se mistura com o tilintar das vasilhas, indica que é hora de tirar o leite das vacas. Depois já é hora de fazer uma limpa no roçado, em seguida, soltar na manga as ovelhas presas no aprisco. A criação desses animais é uma importante fonte de renda da família. As ovelhas servem para o autoconsumo, e quando surge uma necessidade financeira, José Fábio se desfaz de um destes animais.

Fábio não tinha o hábito de contabilizar o quanto ganhava em sua atividade. A partir deste ano ele teve a curiosidade de calcular a produção. Fazendo uma média, desde que conquistou a barragem subterrânea, conseguiu seis mil reais com a primeira horta, onde vendeu alface, coentro, pimentão, batata, macaxeira e feijão. Deste plantio, o agricultor ainda tem guardado uma boa reserva de feijão para vender ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).

Com otimismo, zelo e vigilância para manter a barragem em pleno vigor, o agricultor redobra seus cuidados, a ponto de fazer sempre ótimas previsões. José Fábio está satisfeito com a atividade sustentável, em virtude da surpreendente maneira com que a tecnologia vem fortalecendo as veias da terra e potencializando e guardando a água no seu cacimbão.

Com tudo ocorrendo da melhor forma possível, os desejos do agricultor se ampliam. Ao longe, pensa nos próximos anos, com um bom inverno, onde possa se preparar e expandir a plantação para as frutíferas, aumentar o plantio da ração animal, e permanecer desenvolvendo suas culturas, o que já lhe garante segurança alimentar.

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